quinta-feira, junho 22, 2006

SÓ UM ACIDENTE, PERDÃO.


Não me olhe assim. Não foi por mal. Só um acidente.
Eu coloquei, eu tiro. Vem cá. Não corra, bom homem.
Deixei de fazer esse tipo de coisa faz tempo, intencionalmente, digo.
É que coisas estranhas começaram a acontecer com gente que gosto,
e achei que você pudesse ter algo a ver com isso.
Mas penso que não.
Ou você tem algo a ver ?
Ops...está doendo apertar a gravata assim desse jeito ? Manchou, né ? Vamos colocar ela pra secar. Sobe aqui comigo. Aqui no alto. O tecido é forte. Espero que suporte seu peso. Afinal são oito andares. Apóia um pouco o pé na janela de baixo. Vou acender um cigarro. É rapidinho. Faz bico. Quer um trago ? Parou de fumar. Ah, mas hoje eu quero que você fume, bom homem. Uma tragada e tanto, vem comigo, mas se babar, eu vou ter que te deixar um pouco aí, ou lá embaixo, pra limpar. Sou meio nojento. Já teve herpes ? Então, é bem incômodo.
Vamos lá. Me conte um pouco da sua vida. A gilete não pegou a língua nem as cordas vocais, olhe, tenho uma cicatriz bem aqui, dá pra ver, então, foi seu filho quem fez. Claro que fui eu que dei um jeito nele. Com criança não se brinca. E seu filho tinha umas idéias bem estranhas sobre coisas apertadinhas.
Tá com raiva?
Tire a gravata, fique à vontade, você vai se sentir melhor.
Então é militar? Sei. Patente alta. Que bacana.
Soube que sua ex-mulher expulsou a filha com a neta de casa. Você sabia ? Não ? Pois é. Soube também que a sua ex-mulher apareceu em vários cantos da cidade, na mesma hora, minuto, segundo. O segredo? Oras, mutilação. Se gritar, se chorar, se rir, vai piorar a dor.
De novo, a ponta do sapato na janela de baixo. Hum. O que é isso aqui ? Notas e mais notas. Doações. Para Câncer. AIDS. Hemofilia. Débeis Mentais. Muito bom. Eu digo que você é um bom homem e que isso aqui não passa de um acidente. Nessa hora você se pergunta, lá dentro, no suor que brota, será que ele vai me soltar no final ? Sim, claro que vou. E você vai morrer. Vou soltar bem assim, com um empurrão na cabeça, vertical, para que caia com os pés no chão. Quando o calcanhar bate em uma superfície rígida e reta, como o asfalto novo, por exemplo, por algum motivo, a válvula aórtica do coração simplismeste explode. Fora isso, o maior osso que temos, o fêmur, entra, rompe a bacia e fura com farpas o intestino. O corpo fica reduzido pela metade. Os pés, esses aí com sapatos italianos, ficam bem debaixo do queixo. Menos que a metade, penso agora. Definitivamente. Sabe qual é o problema de manter as unhas assim, sempre aparadas ? Tente enfiá-las nas porosidades da parede. Vai, rapidinho. Eu estou por perto. Confie em mim. Um. Dois. Três. Opa. Viu? O homem superando seus limites. Suas unhas vão crescer ainda por muito tempo. Não é uma boa notícia? Ora, se é. Vamos ouvir música. Trouxe o radinho. Canal de Jesus ? Pode ser ? Não. Aqui. Gosto dessa música. "Por que você não vai chupar o pau do seu pai ?". Conhece ? Fui eu que gravei. Coisa caseira. Uma homenagem. O chiado no fundo é meu cachorro se alimentando. Isso, exato. Gostei desse olhar. Desfibrando sua filha. Ela não era uma boa pessoa como você. Sabe, muito invejosa. Tem uma maneira de fazer silêncio que só as, perdão pela palavra, só as putas têm. Puta rica, eu sei, puta de gringo, mas puta. Fica espalhando doença por aí. E depois pessoas como você precisam fazer doações. Não é justo. Não é cool. Definitivamente. Não é mesmo. Você gosta de ler ? Ops. Segura aí. Mais um cigarro. Traga. Não baba. Ok. Gosta ? Ah, isso é muito bom mesmo. Qual foi o último livro que leu ? Não lembra?! Vai, faz uma força. Se for um que eu goste, te seguro por mais uns minutos. Não vou mentir. Claro que você vai cair, bom homem. Mas uns minutinhos a mais são bons, né ? Vai que os helicópteros da sua aeronáutica não cercam o edifício, né? "Ei, você aí, não solte esse homem ou morre". Engraçado pacas. Ri. Um pouco. Vai, ri. A piada foi boa. É que geralmente, nos filmes e tal, pedem pra gente soltar a vítima. E no seu caso, é pra segurar. Eu gostei. Você gostou? Que bom. Bom homem. Acho que estou ficando cansado. O que significa esse ideograma no meu braço ? Sim, chama ideograma essa letrinha, que não é japonesa, é chinesa. Significa sorte. Sabe que funciona ? Você tem alguma tatuagem ? Não. Tá. Bom, boa sorte. É, chegou a hora. Vai. Assim mesmo. Não sou bom em despedidas. Beijos no inferno.
Fui.

terça-feira, junho 20, 2006

IMAGEM PARA O TEXTO DE ROBERTA NUNES.


( "trainspotting")

Ro: poderia ser melhor.
e veja o estado do Ewan.
heroína pura.
uma beleza.

beijos.

pc.

Eu, eu mesma, e minha gripe

(espirrado por Roberta Nunes, com febre, dor de cabeça e nariz assado e sem imagem, quem quiser e tiver uma legal, pode colocar hoje...)

Hoje, tá difícil.
A gripe me pegou em cheio.
Nada de inspiração.
Nada de nada.
É possível se falar sobre o nada?
Sobre a absoluta falta de algo?
A falta dos sentidos é o que mais me assusta.
Não senti o cheiro do hospital.
Nem o perfume do enfermeiro que me aplicou as injeções (até agora, eu não sei o que tinha nas seringas, mas que deu um barato, isso deu...)
Não senti o cheiro dos cabelos limpinhos da minha filha.
Nem o cheiro do xixi da minha cachorra.
Não senti o gosto do leite frio.
Nem da pasta de dente, durante a tal profilaxia dental.
Só a água tinha gosto , aquele delicioso sabor de nada, vazio e revigorante.
A visão estava turva pela febre, depois, embaçada pela medicação, e, mais tarde, pelo sono inevitável.
Os ouvidos estavam entupidos, parecia que eu estava despressurizada, descendo e descendo a serra, indo em direção ao nível do mar, que não chegava nunca.
Acho que só o tato funcionava, mas a mente não processava a informação, portanto, eu não sabia se estava segurando um abacaxi, ou um gato persa.
Portanto, não me peçam pra escrever algo inspirado.
Isso não existe.
Pelo menos, não hoje.
Simplesmente, não tenho nada pra vocês.
Nem minha identidade, nem minha sanidade que, por sinal, eu nunca tive.
Talvez, só minha vontade.
A incontrolável e louca vontade de me colocar aqui, entre letras e figuras bizarras, entre maçãs e crimes e copa do mundo e nuvens e mortes doces e suaves.
Entre pilhas de lenços de papel usados e garrafas de água vazias e analgésicos e anti-térmicos e termômetro, que não é retal, faço a minha participação na vida desta terça-feira pulsante e inédita, interessante e perfeita.

19/06/2006

segunda-feira, junho 19, 2006

GOSTO DE MAÇÃ



"Porque quem gosta de maçã
Irá gostar de todas
Porque todas são iguais"

Raul Seixas e Paulo Coelho






Não fui capaz de nutrir o corpo que jaz, nem a alma que agora abraça Hades.


Minha doce Luriê, a quem mais poderia escrever esta carta senão a você. Você que me acompanha desde o início, me sente, e sabe das coisas que vão acontecer antes mesmo que aconteçam. Talvez seja capaz de me perdoar. Não por ter me matado, pois suicídio não tem perdão. Que me perdoe por tê-la expulso do aconchego de um ventre que não mais existe, para colocá-la nesse labirinto sem um fio de lã marcando o retorno.


Só na hora da morte, pode alguém dizer se foi feliz ou não, quem disse isso foi o sábio Sólon, não sei se ele era tão sábio assim, tenho a resposta antes mesmo de te descobrir aqui dentro, e foi por você, que tudo adiei. Mas agora que meus peitos cumpriram bem sua função, você é mais forte que o minotauro, já pode viver por si, sigo meu destino.


Para que não pense que o desespero me conduziu ao caminho sem volta, afirmo que toda alegria silenciosa de Sísifo reside em mim, e vou consciente do que faço, apenas não sei “exatamente” como lhe dizer isso, então digo de forma “inexata” usando como simbologia a fruta de que mais gosto: A Maçã. Eva também gostava, e por tê-la oferecida a Adão até hoje nos culpam de expulsão do paraíso.


Sei que não gosta de maçã. Nem mesmo o suco fresco, feito na centrífuga, coada sem nenhuma fibra, seu paladar aprecia. Que isso não seja uma barreira entre nós.


As maçãs são ricas em fósforo, mineral que contribui para a transmissão dos impulsos nervosos, são adstringentes, ajudam a limpar as cordas vocais daqueles que muito a usam e tantas outras qualidades das quais é dispensável falar, já que não é a razão que a fará gostar. Então peço, apenas que veja como toda pessoa muito inteligente adora comer uma maçã. Adora ou precisa, talvez o corpo peça. Observe e tire suas próprias conclusões.


Não estou dizendo que por isso você não é inteligente, ao contrário, uma pequena gênia. Os gênios, e os que superaram o estágio da super inteligência, não se importam com maçãs, já não precisam delas.


Diferente de você, gosto e preciso de maçã - da Green a Red- prefiro todas, mas me atrai em especial uma: a maçã encantada que não há beijo de príncipe que desfaça o encanto. É por ela que morro quando imagino seu gosto entre meus dentes grandes bem calcificados cravando-lhe a massa suculenta enquanto no cantinho da boca, escorrem gotinhas solitárias, chorosas pelo desprezo de não serem engolidas.


A temperança é uma virtude que mora dentro de alguns corpos, impedindo que se embriaguem de maçãs encantadas, os que tem essa virtude vivem mais, não sei se melhor, vão comendo aos poucos, como fez o Bussunda, que morreu sem ver o gol do Adriano e do Fred. Mas será que ele se importava de verdade com isso? O virtuoso Lula, ao contrário de Getúlio, morreu de morta lenta, dolorido de ver, um país dirigido por múmias. Como dessa virtude, pouco me foi dada, não recuei quando tive uma maçã encantada em mãos. Abocanhei toda de uma só vez, me embriagando tal como fez Virgínia, Torquato, Cléopatra.


Não veja a cena como os adultos, que dramatizam tudo e estendem o sofrimento ao máximo, caso contrário me arrependerei de ter confiado a você esta carta e em sonhos, pedirei um sorriso.


Antes de me decidir pela maçã, fui ao psiquiatra: “me mate”, pedi ajuda para morrer. Ele puxou um canivete fez que ia, mas não foi adiante. A desculpa: “pessoas boas não devem morrer”. Psiquiatras não entendem do que deveriam entender, por isso fazem cara de sérios, o disfarce dos charlatões.


Mal sabe ele das minhas maldades, se fosse boa pessoa não deixaria órfã uma filha de caso pensado. Nem seria indiferente ao terrorismo que não poupa nem as crianças. Minha caridade é de mentira, faço doação daquilo que já não me serve, minha indiferença é de verdade, nada de prático fiz para mudá-la. E ainda tem mais, quer maldade maior do que deixar o julgamento para os que ficaram? O julgamento é pior que o suicídio e a indiferença juntos.


Apesar dos pesares, “La Vita É Bella”. De uma beleza infinita, e o Brasil... bem o Brasil... o Brasil pode ser hexacampeão!!!!!


A alegria dos jogos contagia o torcedor, ajuda a tornar a vida ainda mais bela com direito até a nitrato de amilamina e outras coisas legais que ajudam a esquecer problemas comuns, mulheres parideiras com a barra da saia suja do catarro dos moleques que vão pedir dinheiro na porta do banco ou vender balinhas e acrobacias no semáforo.


Um dia todos nós não estaremos mais aqui, para ver tanta beleza, porque nossos olhos também se cansam. Alguns cansam antes, os meus já se cansaram. Eu já me cansei. Cansei da beleza do meu reflexo no espelho, agora quero apenas embelezar a terra, morada das flores, dos frutos e dos seres mais belos do universo: Os vermes. Que eu fique em contato direto com eles, meu caixão deverá ser apenas um vestido de algodão.


Uma muda de macieira deve ser plantada no mesmo local. Mesmo que não goste de maçãs, peço que aprecie o fruto molhado de orvalho nas manhãs que se seguem.


Te amo para sempre e quando quiser me ver vá á macieira. Entre cada folha, em cada fruto, em cada flor, em cada brotinho que cresce lá estarei.


Com carinho,


Mamãe.


"Se realmente entendemos o problema, a resposta virá dele, porque a resposta não está separada do problema". (krishnamurti)



domingo, junho 18, 2006

O CAMINHO DAS NUVENS - 2

Os músculos tensos.
O ato vai ser executado.
O pai não está vendo.
A mãe está exorcizando lesmas.








Caim e Abel.










Vejam as nuves lá no fundo.
Nos dias em que as coisas são definidas, até mesmo as nuvens fogem, Thor é um bosta.
A pequena cidade terreiro de umbanda quando cai a madrugada, mandingas e macumbas
e claro, incesto.
Não há saída para os condenados.
Um crime será cometido. E vencerá quem aprendeu a não se fuder.
Uma outra raça foi criada, que é essencialmente maldita,
em que a ovelha negra não derrapa na lama da subida,
depois da queda.
O portão não se abre.
O irmão sai, acerta, consegue e coloca o gado para correr.
A virgindade não existe mais.
Gemidos e vômitos na madrugada.
Socialites sem pregas.
E chupo mesmo.
"Mulher, o tesão é seu. Eles são apenas homens".
Sim, sou apenas um homem, um mundo perdido,
a ilha tesuda em que acolho os fugitivos da nova raça.
E deixa isso de Hitler pra lá.
Nada a ver.
O totalitário está no gozinho que gera filhos sem amor.
Sonhei em invadir uma escola primária
e fazer filhos em todas as pessoas,
mesmo nos homens covardes.
Nas meninas lindinhas.
Ah, fodam-se com todas as letras.
Ajoelhou, não precisa rezar.
Pode morder e cuspir fora
a lesma
para a mãe exorcizar.
Que os próprios demônios negros, esses estão fincados falicamente
dentro da barraca dita "casinha de família".
Você quer namorar, garota ?
Você quer casar, garota ?
Vá vender isso aí.
Você sabe a origem da sua cidade, do seu feudo ?
Quanto está custando o garfo mais barato ?
Pra comer e adubar a terra do seu café.

Vai, estraga o amor, estúpida.
Vai, covarde, abaixa a cabeça.
Te faço um filho.
Tão bonito como eu.
Vai irmã, me chupa a cana e assobia sua prece para a América do Norte.

Hoje é dia de matar.
Saiam da frente, nuvens.

O dia está lindo.

Comerei sua carne.

Excitarei seu segredo.

Castigarei a sua semi-nudez de semi-musa,


"Você fez tudo errado",

com minha porra lhe escorrendo na cara, mocinha de bem-querer latifundiário e depilação.

Julgue seus anos de azar, velha.

Eu tenho braços fortes.

Beijos.

( sei lá se tem erro de digitação. )